"Uma vaga noção de tudo, e um conhecimento de nada."
Charles Dickens (1812 - 1870) - Escritor Inglês

quinta-feira, 30 de agosto de 2018

O Glubador, por Jô Soares

O glubador (Conto nonsenssíssimo)
Jô Soares

O coronel perguntou ao novo recruta:

— O senhor faz o quê na vida civil?

— Bom, coronel. Eu sempre fui glubador.

— Glubador?

— É. O senhor, como homem instruído, sabe naturalmente o que é um glubador.

— Claro, claro! Glubador! — respondeu o coronel, que não era homem de se dar por achado. — E como glubador você naturalmente faz. . . faz. . .

— Glubeiras, não é, coronel? Eu faço glubeiras.

— Evidentemente! Glubeiras! Já fez alguma glubeira aqui pro meu quartel? — perguntou o coronel, disfarçando a sua ignorância.

— Como, se nunca me deram material para construir uma? — respondeu o soldado.

— Mas isso é um absurdo! Então eu tenho um glubador no regimento e ele ainda não fez nenhuma glubeira? Eu lhe dou carta branca para fazer uma imediatamente. Na sua opinião, o material ideal para se fazer uma glubeira seria. . . seria. . . ?

— É lógico que o senhor sabe que uma boa glubeira se faz de alumínio. Fica meio caro mas o senhor tem uma glubeira pra toda vida.

— O custo não importa! Eu quero que você comece a fazer uma glubeira de alumínio amanhã! — disse o diretor.

— Pois não, coronel. De que tamanho? — perguntou o soldado.

— Não sei. O especialista é você.

— Bom, depende do gosto. Pra mim, uma glubeira profissional deve ter 5,30m de comprimento por 3,52m de largura e 15cm de espessura. Isso se o senhor quiser uma glubeira clássica — explicou o soldado.

— É claro que eu quero uma glubeira clássica! Nada de modernismos! — falou o coronel muito senhor de si.

Uma semana depois, o soldado-glubador dava os últimos retoques na chapa de alumínio. Curioso, o coronel foi ver como andava sua glubeira. Ao chegar, viu a chapa toda perfurada com orifícios que iam de 10 a 15cm. Quase enlouqueceu:

— Quem foi que furou a minha glubeira?!!

— Fui eu, é claro, coronel. Sem os respiros ela não funciona — afirmou o glubador.

— Muito bem! Muito bem! Só estava vendo se o senhor conhece

mesmo o seu serviço! — disfarçou o coronel. — E onde é que nós vamos usar essa maravilhosa glubeira?

— Num lago ou num rio, é claro.

Assim transportaram a glubeira até a beira de um lago e lá ela foi lançada na água pelo glubador, afundando no lago a seguir.

O coronel ficou louco.

— O que é isso?! Então eu gasto uma fortuna para fazer uma glubeira e você joga a minha glubeira na água! Louco!! Você vai preso!!

— O coronel me desculpe, coronel, mas pelo visto parece que o senhor não sabe o que é uma glubeira — disse o soldadoglubador.

— Não sei mesmo! Mas agora você vai me explicar! — desabafou o coronel. O glubador elucidou-o calmamente:

— Pois então o senhor não viu que a glubeira funciona exatamente quando afunda? Só aí é que ela faz: GLUB... GLUB... GLUB... GLUB...


Em "O Astronauta sem Regime", Jô Soares - Círculo do Livro

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