"Uma vaga noção de tudo, e um conhecimento de nada."
Charles Dickens (1812 - 1870) - Escritor Inglês

sexta-feira, 3 de junho de 2016

Poesia a Qualquer Hora (249) - Cassiano Ricardo

Futebol

O pequenino vagabundo joga bola
e si correndo atrás da bola
que salta e rola.
Já quebrou quase todas as vidraças
inclusive a vidraça azul daquela casa
onde o sol parecia um arco-íris em brasa.

Os postes estão hirtos de tanto medo.
(O pequenino vagabundo não é brinquedo...)
E quando o pequenino vagabundo
cheio de sol, passa correndo entre os garotos,
de blusa verde-amarela e sapatos rotos,
aparece de pronto um guarda policial,
o homem mais barrigudo deste mundo,
com os seus botões feitos de ouro convencional,
e zás! Carrega-lhe a bola!
“Estes marotos
precisam de escola...”

O pequenino vagabundo guarda nos olhos,
durante a noite toda a figura hedionda
do guarda metido na enorme farda
com aquele casaco comprido todo chovido
de botões amarelos.
E a sua inocência improvisa os mais lindos castelos;
e vê, pela vidraça,
a lua redonda que passa, imensa,
como uma bola jogada no céu.
“É aquele Deus, com certeza,
de que a vovó tanto fala.
Aquele deus, amigo das crianças,
que tem uma bola branca cor de opala
e tem outra bola vermelha cor do sol;
que está jogando noite e dia futebol
e que chutou a lua agora mesmo
por trás do muro e, de manhã, por trás do morro,
chuta o sol...”

Cassiano Ricardo

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